quarta-feira, 17 de setembro de 2008

Borboleta - A História Holistica¹ de Uma Menina do GP

{na íntegra}


Se for tocar lá no fundo, na essência dos meus quase 19 anos, numa coisa eu sempre acreditei: leva tempo pra entender o que acontece no presente.

Faz sete anos que eu entrei no Grupo Primavera. Três que saí. E minha historia na entidade não foi das mais tranqüilas.

Aos 11 anos, eu estava na 6ª série de uma escola de bairro, 31 de Março, e entrei no GP sob protesto. Não queria e ponto! Dá pra entender? Mas minha mãe insistiu, aliás, uma das características dela que adquiri: insistência.

A primeira aula que eu me negava a gostar era a da Mirian. Será que ela não consegue nada sem gritar? No 2º ano, a revolta foi com o bordado – e é a revolta que eu guardo até hoje. Putz! Precisa de muita paciência!

No auge do 3º ano, apaixonada pelas aulas da Graça e sempre confiante com o que escrevia (se tem algo que eu sou boa, é com as palavras!) entrei para o PACTO. Isso não foi muito depois de eu decidir que estudar na ETECAP era o que eu precisava.

Juro que não era boa aluna, daquelas exemplares. Eu sempre esquecia alguma coisa ou outra e/ou não estudava e talz... Na época, queria fazer bioquímica, mesmo mal sabendo do que se tratava, com o intuito de arranjar emprego para pagar uma faculdade de Marketing. Mal sabia eu que viria a descobrir que humanas², de forma alguma, era o meu forte.

No dia da prova da ETECAP eu entrei na sala querendo ir embora, comecei a prova querendo terminar, pintei cada quadradinho das alternativas desejando que eles não existissem. Eu sabia e não sabia que estava pronta.

Na época, estava no 1º colegial, estudava na Barão Geraldo de Rezende e passava por uma fase difícil na escola: rejeição. Me falaram que eu não merecia estudar numa escola como a ETECAP. Então, meu desejo de mostrar quem não merecia estudar em qualquer lugar que fosse era muito maior que a vontade de entregar aquela prova incompleta mesmo.

A minha vida escolar no Rezende durou mais seis meses alem do ano letivo do 1º colegial. Tempo suficiente, acrescento, para MOSTRAR, veja só, quem não merecia estar onde?

Foi um alivio bem grande garantir a minha vaga na escola que eu admirava desde a 7ª serie, quando fazia inglês. Novamente não fui uma boa aluna, das que se dedica. Peguei dependência dois semestres seguidos, mas dei a volta por cima e me recuperei. Era uma aluna mediana. Até então, tinha mudado de escola no ensino médio, estudava no Dom João Nery. Lá conheci pessoas que me ajudaram muito, garotas que deram um up em minha auto-estima e me fizeram, num salto, ser muito mais confiante e feliz comigo. A falta dessas coisas que, acredito, me levou a ser bem castigada no GP. Eu tentava expelir o que achava que não tinha, prejudicando todos ao meu redor. Eu não era feliz comigo e atrapalhava os outros.

Tive acompanhamento psicológico, a família se uniu, os amigos, ao invés de afastar, aproximaram. Isso foi essencial.

Fechei o ano de 2006 formada. Na ETECAP e no ensino médio. Já não era mais menina do GP. Tinha 17 anos e me neguei a empregar-me pelas empresas do JEMT. Meu futuro era outro, eu já sabia.

Prestei UNICAMP. Não estava pronta, eu sabia. Não passei. Mas eu tinha planejado o que fazer: cursinho. Cooperativa do Saber, é claro; não troco por nada! Eu entraria numa Universidade publica; era o meu próximo objetivo. Algo que eu não imaginava estar tão próximo.

O ano de 2007 teve gosto de “já não passei uma vez” e, mesmo assim, não fui uma boa aluna, das que se dedica. Por Deus, não sejam assim! Se eu tiver um conselho pra dar eu dou: ESTUDE! Você não chega em lugar algum se não estudar! Eu simplesmente sou um tanto mais abençoada, com um tanto mais de inteligência e/ou facilidade para aprender; tive uma pitada de sorte.

No cursinho, a água, como dizem, “bateu na bunda” lá pra setembro. Assistia aulas de manhã e à noite. Entrei num programa no governo para garantir passes de ônibus. Havia dias que eu saía de casa às 6h30 e voltava às 23h30. E não estava satisfeita.

De lá até pouco tempo atrás, nunca estudei tanto. Fazia redações na hora do almoço, resumos na hora da janta; claro que não todo dia, mas na maioria das vezes. Fiz a 1ª fase. Estava feito. E de lá até o resultado tive exatamente um mês. Um mês que só não foi mais tenso que os vinte dias que levaram ao resultado da 2ª fase. Sim, eu tinha passado, eu estava na 2ª fase. Eu concorreria com mais 2 a minha vaga.

Algo que nunca abri mão foi MINHA VAGA na escola publica. Quando entrei na ETECAP, o pensamento não foi o de “peguei a vaga de alguém” e, sim, “conquistei a minha vaga. Só minha”. Talvez seja por isso que não sofri exatamente com a colocação da minha amiga de PACTO/ETECAP/Cursinho/Estagio, que ficou tão longe de mim. Algumas pessoas chamam isso de competitividade. Eu chamo de foco.

Alias, a única coisa que me diferenciou das outras meninas na minha época foi o foco. Eu, desde sempre, não quis me resumir ao meu mundinho (leia-se: manter-me no mesmo lugar), eu sempre quis ir além e tive apoio dentro de casa – o que é muito importante.

Então eu estudei. A maioria dos dias eu levantava às 8h e largava das apostilas às 20h, com uma hora e meia, duas de almoço. Eu prestei biologia; decidi na metade do ano. Totalmente diferente daquela menina que queria entrar no Mackenzie, agora o meu objetivo era ela, a 117ª melhor Universidade do mundo, a melhor Universidade do Brasil: UNICAMP.

Eu sabia e não sabia que estava pronta pra entrar na UNICAMP (na verdade, eu tenho duvidas quanto a isso – estar pronta – até hoje). Dezenas de pessoas torciam por mim (sim, eu disse dezenas); eu tinha algo à cumprir com elas e comigo. Eu agonizei longos 20 dias para saber a resposta: eu tinha falhado, eu não tinha passado. Então sofri.

Dia 12 de fevereiro, dia da matricula, era aniversario da minha mãe e eu queria demais dar esse presente para ela. É pedir demais? Eu bem devia saber com o que estava lidando: estava lidando com centenas de pessoas que tinham o mesmo objetivo que eu, centenas de pessoas que batalhavam por suas vagas, como eu. Eu fui fraca, eu morri na praia.

Dia 12 de fevereiro também era dia da listagem de 2ª chamada. Afinal, nem tudo estava perdido! Das 45 vagas, a minha posição era 52. efetivamente, cinco pessoas teriam que morrer pra eu ser chamada. E então? Então que 11 , eu disse ONZE pessoas “morreram”, ONZE pessoas rodaram na lista de Biologia Licenciatura. E aqui estou eu. Matriculada, além da minha nota 3,0 em matemática. Aluna da UNICAMP. Bixete à milanesa³ da turma 08N.

Se eu sei o que aconteceu? Não. (ou, talvez até saiba) Foram tantos “parabéns”, tantos “você merece”, tantos “é o resultado do seu esforço (e recompensa dos quilinhos a mais)”, tantos “eu não conseguia ver você em outro lugar” que... será que tem como pensar em algo?

Tem com eu pensar que as pessoas ao meu redor acreditavam mais em mim que eu mesma. Que elas viam e mim uma dedicação que eu jurava não existir. Que elas tinham (têm) uma fé incomparável.

Talvez mais por elas foi a razão desse resultado chegar. Talvez pelo fim do fato de 2007 ter tanto gosto de “não passei uma vez”. Talvez.

A gente nunca sabe se está certo, não sabe se o caminho é firme (na verdade, o caminho firme é só aquele que a gente acredita que nos levará ao nosso objetivo, ou o mais próximo dele.), não acreditamos que o que fazemos é válido.

As vezes tenho a impressão de que é necessário sofrer um pouco para melhor considerar o premio. Não que o premio vir de primeira seja menos válido. Mas quando aperta no peito e nossos olhos insistem em derramar lagrimas tristes e decepcionadas e alcançamos o que tanto almejamos, o sabor de vitória se intensifica.

Não foi a primeira vez que isso me aconteceu, mas dessa vez a promessa interna é muito mais intensa: sem medo, sem distrações (tudo bem, uma festa ou outra a gente abre exceção!), sem morrer na praia. E sabem... essa é uma das promessas que mais tem me dado trabalho. Porque saber que você quase esteve lá e não consegui é muito pior que afogar-se no meio do caminho.

Escrever isso pra vocês não é apenas pra mostrar “UAU ! COMO EU SOU BOA !”. escrevo pra mostrar à vocês, meninas do Primavera, que, apesar de serem quem são, de morarem onde moram, de estudarem onde estudam, vocês têm muito mais dentro de si do que imaginam! Se leram até aqui, é porque algo as atrai, é porque, de uma forma ou de outra, algo as incita a buscar entender um pouco mais como a vida funciona. É porque querem aprender a ser melhores.

Vocês, meninas, têm que entender que estão partindo do mesmo ponto que eu parti, tem que perceber que fazem parte de um grupo que pega carvões e transforma em diamantes. Afinal, o que são diamantes? Pedras lindas e valiosas que eram carvões e um dia foram lapidadas.

Lembram quando eu disse que o tempo mostraria os porquês do presente? Eis as respostas do tempo para mim: “Mirian é tão imensa como pessoa quanto sua voz, é pequena, mas é um gigante; você não foi feita para linhas e agulhas, mas precisará delas um dia; você não foi uma boa aluna, das mais dedicadas, mas aprende a ser; você sofreu, mas alcançou. Não se ensoberbeça, sempre que o fez, caiu. Seja humilde; as pessoas se aproximam e apaixonam naturalmente.”

Hoje vocês são meninas como eu fui (ou, talvez, ainda seja). Logo (acreditem, bem logo!) serão maduras, viverão pouco e intensamente, o suficiente para acreditar que viveram muito, darão conselhos, olharão para trás e dirão que valeu a pena, dirão que fariam tudo de novo, da mesma forma, assim como eu digo. Verão, assim como eu, uma menina vitoriosa que alcançou tudo o que se propôs alcançar. Verão um caminho feliz.

Provavelmente, hoje vocês não vêem o que vem à frente, mas estou aqui para mostrar a cada uma de vocês que é completamente possível alcançar sonhos, que se pode ir onde quiser. Está próximo, basta querer. Basta estender a mão e acreditar.

Verão que é tempo da borboleta sair do casulo. Tempo dela abrir as asas e voar. Tempo de ser livre para voar, porque o céu é logo ali.


Raabe Moreira Gabriel, também conhecida por
Byzinha ou Habib O8N Biologia Unicamp.



¹ Holístico é algo que gera um efeito, digamos, bovino nas pessoas, tipo: “Huummmmm...”, algo meio que surpreendente ou “O.o” ou “=O”
² A área de Humanas compete todas aquelas matérias que tem que decorar regras e datas, como historia, português, geografia entre outros. Alguns cursos em faculdades com essa classificação são: Administração – que você, menina do GP, vai aprender ou já está aprendendo – Letras, Artes, Ciências Sociais, Geografia, Filosofia, Historia, blábláblá.
³ Bixete à milanesa, no caso, é quando o bixo do gênero feminino, sai da matricula e recebe quilos de tinta pelo corpo, um banho de balde e pula na areia, assim... à milanesa. Nada de pânico futuras aspirantes à qualquer faculdade! Você vai ter estudado tanto e tão feliz por ter passado, que não vai ver nenhum problema em voltar pra casa cheia de areia nos bolsos da calça. (:

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